Crianças famintas lançam pedras em panelas vazias,
brincam com a desgraça do dia a dia,
em breves “alegrias”,
enganam a dolorosa sensação do nada em corpos descarnados,
em bolsões de pobreza amontoados,
entregues a própria sorte,
sem saber que estão na mira da morte.
A “mão do mercado”,
em conluio com o Estado,
rouba mais um pacote de arroz, o feijão há muito já falta.
Crianças chorando, castigadas pela fome,
a mãe, sozinha, desempregada e desesperada,
pensa em se prostituir para colocar comida no prato.
Ontem foram ossos, hoje será terra temperada,
enquanto a minoria engravatada come picanha, caviar e vinho importado,
articulando mais um megarroubo de milhares de dignidades.
Fome do corpo, fome da alma, dor que mata
lentamente, por etapas.
Corpos fustigados pela ganância dos endinheirados,
apoiados por fanáticos religiosos, moralmente fracos
que manipulam políticos
aquiescentes,
feito ventríloquos,
vozes da pseudo-honestidade,
inventam uma realidade deslocada dos fatos,
faturam mais,
em conjunto,
em nome daquele acordo fechado.
Hoje milhares de pessoas não dormem, atormentadas,
castigadas pela fome
enquanto os Abutres descansam, empanturrados,
em lençóis de seda e colchões importados,
nas suas bolhas sem humanidade.
Abutre, presságio da morte, símbolo de um país desorientado,
vidas fragilizadas, entregues ao acaso.
Poema publicado na D-ARTE - Revista eletrônica e interativa de arte e cultura, Londrina - PR, #.19, Quem somos nós na fila do osso?, 17/10/2021.
Link da revista:
https://dartelondrina.files.wordpress.com/2021/10/revista_d_arte_numero_19.pdf
Imagem de Myriams-Fotos por Pixabay